Saturday, September 22, 2007
FUTEBOL ARTE x FUTEBOL ARTE
Thales
Antes de iniciar este post gostaria de declarar que, exceto pelo lance da foca, não tecerei comentários sobre o clássico.
Até então assistia ao jogo de pé, andando de um lado para o outro no último degrau da arquibancada. Após o quarto gol cruzeirense, tal qual um ponto de interrogação, sentei-me cabisbaixo.
Foi quando Kerlon recebeu uma cobrança de escanteio na extrema direita. Levantou a bola na altura da cabeça e fez a única coisa que até hoje demonstrou saber, o drible da foquinha. Confesso que não fiquei emputecido ou revoltado com o lance, na hora pensei, “puta que o pariu, 4x3 de revirada e ainda por cima com direito a foquinha, hoje é dia”. Coelho não pensa como eu. Imediatamente correu até Kerlon e o tackleou (peço perdão pela expressão, mas não encontro palavra melhor para descrever o ocorrido), num lance característico do futebol americano.
Segue aqui meu parecer sobre o evento. Tenho pra mim que o drible executado por Kerlon (no jogo em questão) não é arte, é artifício, e isso são duas coisas muito distintas (a arte passa pelo artifício, mas raramente a premissa oposta é verdadeira), fosse arte e o tal "Ricardinho das embaixadas" ou qualquer moleque de sinal seria o novo Pelé. A arte é um exercício de improvisação. Uma coisa é o sujeito, de costas para o marcador, receber um passe-tijolo, dominar mal a bola e ela sobrar na altura da cabeça, que faz ele então?, gira em cima do marcador fazendo o drible da foquinha, eis uma jogada de rara luminescência, outra coisa, muito diferente, é o sujeito parar a bola, deliberadamente levanta-la e depois conduzi-la como uma foca. É como num truque de mágica, no primeiro exemplo o cidadão surpreende e encanta a platéia com o improvável, no segundo exemplo ele conta a mágica para depois faze-la, o truque perde seu encanto, é nessa linha tênue que o drible deixa de ser arte para se tornar artifício.
Por outro lado, ao contrário do que também dizem por aí, não vejo a jogada de Kerlon como menosprezo pelo adversário, trata-se de uma provocação (assim como foi o caso Edmundo x Gonçalves ou o gol de calcanhar do Túlio, ao contrário do caso Edílson x Palmeiras). Pode alguém argumentar que se trata de uma questão deveras subjetiva. Não creio, a linha que divide a graça da molecagem é tão espessa quanto a Muralha da China. Qualquer um que já brincou de pelada no recreio sabe disso, é o famoso “sem avacalhar”, tentar driblar pode, claro que pode, todos gostam, mesmo os que não sabem, mas “sem avacalhar”, se for sentar na bola ou pegá-la com as mãos não brinca mais.
Já que regressei à terceira série aproveito para falar de Coelho, trata-se de um apelão. Mas não o condeno por isso, acontece, no calor da disputa o cidadão eventualmente perde a cabeça, por muito menos, você, caro leitor, já deve ter perdido a sua n’algum clássico. Mas ele é profissional, há de argumentar uma mente mais simplória. No que eu pergunto, e por isso menos humano? Sequer vejo o lance de Coelho como uma agressão, foi uma entrada duríssima, passível de expulsão, nada mais que isso.
Para concluir, futebol arte, o verdadeiro futebol arte, é o que se viu quarta-feira pela Liga dos Campeões na partida do Fenerbahçe. O gol de Deivid foi qualquer coisa para se guardar numa caixinha de veludo. Se o clube acabasse amanhã, daqui 80 anos alguém ainda comentaria em Istambul o gol marcado naquela Champions em que o Fernerbahçe venceu a Inter por 1x0. Alex domina a bola na direita, próximo ao bico da pequena área, aplica seu drible clássico (a pedalada perneta) em Maxwell, que cai sentado no chão, a beleza da coisa é que o marcador não se desequilibra, ele vai ao solo como se o chão tivesse sido removido sob seus pés, então Alex levanta a cabeça e, de perna direita, alça a bola em direção ao centro da área, onde Deivid acerta um voleio à la Van Basten. Até que Kerlon como muito feijão, não venham me vender gato por lebre.
Thales
Antes de iniciar este post gostaria de declarar que, exceto pelo lance da foca, não tecerei comentários sobre o clássico.
Até então assistia ao jogo de pé, andando de um lado para o outro no último degrau da arquibancada. Após o quarto gol cruzeirense, tal qual um ponto de interrogação, sentei-me cabisbaixo.
Foi quando Kerlon recebeu uma cobrança de escanteio na extrema direita. Levantou a bola na altura da cabeça e fez a única coisa que até hoje demonstrou saber, o drible da foquinha. Confesso que não fiquei emputecido ou revoltado com o lance, na hora pensei, “puta que o pariu, 4x3 de revirada e ainda por cima com direito a foquinha, hoje é dia”. Coelho não pensa como eu. Imediatamente correu até Kerlon e o tackleou (peço perdão pela expressão, mas não encontro palavra melhor para descrever o ocorrido), num lance característico do futebol americano.
Segue aqui meu parecer sobre o evento. Tenho pra mim que o drible executado por Kerlon (no jogo em questão) não é arte, é artifício, e isso são duas coisas muito distintas (a arte passa pelo artifício, mas raramente a premissa oposta é verdadeira), fosse arte e o tal "Ricardinho das embaixadas" ou qualquer moleque de sinal seria o novo Pelé. A arte é um exercício de improvisação. Uma coisa é o sujeito, de costas para o marcador, receber um passe-tijolo, dominar mal a bola e ela sobrar na altura da cabeça, que faz ele então?, gira em cima do marcador fazendo o drible da foquinha, eis uma jogada de rara luminescência, outra coisa, muito diferente, é o sujeito parar a bola, deliberadamente levanta-la e depois conduzi-la como uma foca. É como num truque de mágica, no primeiro exemplo o cidadão surpreende e encanta a platéia com o improvável, no segundo exemplo ele conta a mágica para depois faze-la, o truque perde seu encanto, é nessa linha tênue que o drible deixa de ser arte para se tornar artifício.
Por outro lado, ao contrário do que também dizem por aí, não vejo a jogada de Kerlon como menosprezo pelo adversário, trata-se de uma provocação (assim como foi o caso Edmundo x Gonçalves ou o gol de calcanhar do Túlio, ao contrário do caso Edílson x Palmeiras). Pode alguém argumentar que se trata de uma questão deveras subjetiva. Não creio, a linha que divide a graça da molecagem é tão espessa quanto a Muralha da China. Qualquer um que já brincou de pelada no recreio sabe disso, é o famoso “sem avacalhar”, tentar driblar pode, claro que pode, todos gostam, mesmo os que não sabem, mas “sem avacalhar”, se for sentar na bola ou pegá-la com as mãos não brinca mais.
Já que regressei à terceira série aproveito para falar de Coelho, trata-se de um apelão. Mas não o condeno por isso, acontece, no calor da disputa o cidadão eventualmente perde a cabeça, por muito menos, você, caro leitor, já deve ter perdido a sua n’algum clássico. Mas ele é profissional, há de argumentar uma mente mais simplória. No que eu pergunto, e por isso menos humano? Sequer vejo o lance de Coelho como uma agressão, foi uma entrada duríssima, passível de expulsão, nada mais que isso.
Para concluir, futebol arte, o verdadeiro futebol arte, é o que se viu quarta-feira pela Liga dos Campeões na partida do Fenerbahçe. O gol de Deivid foi qualquer coisa para se guardar numa caixinha de veludo. Se o clube acabasse amanhã, daqui 80 anos alguém ainda comentaria em Istambul o gol marcado naquela Champions em que o Fernerbahçe venceu a Inter por 1x0. Alex domina a bola na direita, próximo ao bico da pequena área, aplica seu drible clássico (a pedalada perneta) em Maxwell, que cai sentado no chão, a beleza da coisa é que o marcador não se desequilibra, ele vai ao solo como se o chão tivesse sido removido sob seus pés, então Alex levanta a cabeça e, de perna direita, alça a bola em direção ao centro da área, onde Deivid acerta um voleio à la Van Basten. Até que Kerlon como muito feijão, não venham me vender gato por lebre.